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segunda-feira, 17 de setembro de 2007

O Poder da Sétima Arte


O cinema e a educação

Na década de 1920, o cinema tornou-se a principal forma de diversão, levando às salas de exibição crianças, jovens e adultos, para assistirem as histórias de amor, de heróis e de bandidos contadas nos filmes. A freqüência aos cinemas e os temas filmados estimularam, entre os intelectuais, a discussão sobre o uso e o papel do cinema nas sociedades pós Primeira Guerra Mundial. Analisando os filmes e o público consumidor de películas, os intelectuais (professores, jornalistas, católicos) passaram a identificar o cinema como um importante veículo de persuasão, sendo capaz de influir diretamente a mente das pessoas. A partir dessa constatação, passaram a propor o uso da cinematografia como um instrumento auxiliar na educação, na higienização, na formação de uma raça forte, e na divulgação de valores nacionais. Ao mesmo tempo em que reivindicavam uma produção de películas moralizadas, condizentes com uma moral social e católica, apontavam o fato de que esta nova postura cinematográfica somente seria possível com a intervenção do Estado.


Segundo os intelectuais brasileiros, o Estado era o único organismo capaz de incentivar o cinema educativo, pois somente ele poderia impor leis que obrigassem a produção de filmes desse gênero. Esse movimento não foi exclusivo do Brasil. Na Itália grupos da sociedade civil também se organizaram exigindo uma produção de caráter educativo. Tais movimentos colaboraram para que Getúlio Vargas e Benito Mussolini compreendessem o poder do cinema como veículo de persuasão, levando-os a adotarem uma política de controle e estímulo do cinema nacional. Na Itália, esta política teve como marco a fundação do LUCE, em 1924. No Brasil, a política de proteção ao cinema foi inaugurada em 1932, com o decreto nº 21.240, que regulamentava a censura e a exibição obrigatória das películas nacionais.

Esse movimento de valorização do cinema levou Vargas e Mussolini a exaltarem as vantagens do cinema como veículo ideológico. Entre as qualidades assinaladas por Vargas e Mussolini estava a linguagem. Segundo esses líderes, os filmes possuíam uma “língua compreensível a todos os povos da terra” (2) facilitando a introjeção pelo público da informação divulgada. Afirmavam que através da narrativa divertida e de fácil compreensão o cinema passava uma série de informações e valores sem que o público percebesse, pois estava envolvido pelas histórias e, assim, não questionava as informações. Os governos que utilizaram o cinema educativo como veículo ideológico acreditavam que, utilizando a linguagem fácil do cinema, poderiam divulgar os valores nacionais sem que as massas ficassem enfadadas, pois estaria apreendo e se divertindo.

Uma outra vantagem do cinema era não exigir o conhecimento das letras pelo público. Esta qualidade foi apontada por Mussolini, no discurso de inauguração do Instituto Internacional de Cinema Educativo em 1928, o “cinema tem vantagem sobre o livro e o jornal: fala aos olhos, (...)”(3). A mesma qualidade foi observada por Vargas: o cinema influi “diretamente sobre o raciocínio e a imaginação, apura as qualidades de observação, aumenta os cabedais científicos e divulga o conhecimento das coisas, sem exigir o esforço e as reservas de erudição que o livro requer e os mestres, nas suas aulas reclamam” (4). Ao falar diretamente aos olhos, ao raciocínio e à imaginação, o cinema influía sobre as massas analfabetas educando-as e conquistando-as. O cinema, desta forma, superava em eficiência os meios de comunicação escritos, pois permitia que os valores e os ideais dos Estados nacionalistas fossem divulgados através das imagens, aos grupos analfabetos. O analfabetismo não era uma realidade exclusiva do Brasil, grande parte da população italiana desconhecia as letras. Isso tornava o cinema um veículo atrativo aos ministérios da educação dos dois países.

Observando as vantagens do cinema como instrumento de propaganda e de educação, a sétima arte adquiriu no governo de Vargas e de Mussolini uma certa importância e status.

No governo de Vargas, o cinema foi idealizado como um instrumento de aproximação. Segundo Getúlio, o cinema era capaz de “aproximar, pela visão incisiva dos fatos, os diferentes núcleos humanos dispersos no vasto território da República” (5). Getúlio Vargas observava que as distâncias regionais, políticas, territoriais e econômicas sempre foram um entrave ao crescimento nacional. Desde o início do seu governo, em 1930, Vargas procurou combater estas distâncias criando um discurso nacionalista que visava direcionar os estados e o povo para a figura do líder central. A primeira iniciativa unificadora foi simbólica. Em 1937, Getúlio Vargas reuniu todas as bandeiras dos estados e as queimou representando o fim da desunião. A partir desta cerimônia, todos os estados estavam representados pela bandeira nacional, símbolo de um único governo e um único povo.

Com a missão de estimular a identificação do povo com a nação e assim diminuir as distâncias, os filmes educativos produzidos durante o Estado Novo recorreram ao uso dos símbolos nacionais. A bandeira nacional, por exemplo, aparecia na seqüência de abertura do cine jornal brasileiro, produzido pelo DIP. Em alguns filmes do INCE, o pavilhão auriverde aparecia grandioso, tremulante no céu do Brasil associando o seu esplendor e beleza à pátria construída por Vargas.

O Mapa do Brasil também apareceu em alguns filmes, sendo utilizado como mapa logotipo (6). Os mapas logotipos, segundo Anderson, têm a função de remeter a população ao espaço físico do país, tornando, assim, a nação e seu governo reconhecidos pela população. Para Getúlio Vargas, o movimento de aproximação promovia um conhecimento interno, fundamental para o despertar do patriotismo, pois, segundo o discurso estado-novista somente o conhecimento do Brasil estimularia o amor à pátria e o desejo de lutar por ela.

Mussolini também elegeu o cinema como instrumento de aproximação. Em seu discurso observou que a principal missão do Instituto Internacional de Cinema Educativo – ICE (7) era “facilitar e acrescer as relações culturais entre os povos(...)”(8). Esta função conferida por Mussolini se explicava pelo clima hostil que pairava sobre a Europa na década de 1920. Ao final da Primeira Guerra Mundial, o velho continente se esforçava para reconquistar um clima de paz e colaboração entre os povos. Neste contexto, o cinema surgiu diante dos olhos de Intelectuais e políticos como um grande aliado na aproximação das nações, pois sua língua era compreensível a todos os povos da terra (9). Nesse cenário, a missão do cinema seria de disseminar conhecimentos acerca dos costumes e da cultura dos povos, promovendo a compreensão das suas mentalidade e das necessidades. A idéia era que, através dos filmes, o espectador europeu compreendesse que em outros países do continente as dificuldades e os problemas eram os mesmo do seu país, e, a partir desse entendimento, se tornassem mais solidários com o antigo inimigo (10).

Além da função humanitária de aproximar os povos inimigos, o cinema era apontado por Mussolini, como um veículo de propaganda. Apesar de ter saído da Primeira Guerra Mundial como vencedora, a Itália não conquistou um lugar de destaque na nova ordem mundial, sendo rechaçada pelas principais potências. Ao tomar o poder, em 1922, Mussolini se comprometeu, através de seu programa nacionalista, em reconquistar para a Itália um posto de destaque, fazendo, assim, com que a nação italiana recuperasse o orgulho nacional. Tendo como meta a conquista do espaço que caberia a Itália, Mussolini passou a encarar o cinema como L’arma più forte, capaz de fazer a propaganda externa e interna do regime fascista.

por Cristina Rosa

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